Como o James Webb detectou uma molécula em um planeta a 124 anos-luz da Terra?
Personagens improváveis roubaram a atenção da mídia em meio aos tarifaços de Trump e o micão de Katy Perry a bordo do minifoguete de Jeff Bezos: alienígenas.
Ou melhor… uma vaga chance de alienígenas.
Um grupo de astrônomos encontrou possíveis sinais de vida em K2-18b, um exoplaneta localizado a 124 anos-luz da Terra. “Exoplaneta”, vale lembrar, é qualquer planeta que orbita ao redor de uma estrela diferente do Sol.
Usando dados do telescópio James Webb, a equipe identificou uma molécula chamada dimetilsulfureto (DMS) — que, no nosso planeta, só é produzida pelo fitoplâncton, o grupo de microorganismos aquáticos como algas e cianobactérias que faz boa parte da fotossíntese dos oceanos.
Essa descoberta, por ora, está em 3 sigma (que é uma espécie de unidade de medida de confiança dos estatísticos: nos diz que há apenas 0,3% de chance de que a observação seja resultado do acaso e esteja errada). Para uma confirmação cabal, precisamos de 5 sigma, o equivalente a apenas 0,00006% de chance.
Não se anime excessivamente, claro. Ainda que o DMS esteja lá, sempre existe a chance de que algum processo químico abiótico esteja gerando o dito-cujo, sem envolvimento de qualquer criaturinha microscópica. E mesmo que haja algo de biótico em K2-18b, o mais provável é que o tal algo consista em formas de vida microscópicas ou muito pequenas.
Nas palavras de Edward O. Wilson, a maior lenda da biologia na Universidade Harvard, “qualquer que seja a condição da vida alienígena, quer ela floresça na terra firme e no mar, quer ela apareça apenas em pequenos oásis, ela consistirá majoritária ou inteiramente em micróbios”.
Wilson se baseia, é claro, no fato de que a vida na Terra consiste majoritariamente em micróbios. O planeta é deles. Cada centímetro cúbico de esponja de pia suja contém 54 bilhões de bactérias de 362 espécies. As que não gostam de pia podem viver em lagos de soda cáustica, na água fervente de chaminés submarinas e até no caldo ácido de rejeitos de mineração.
Por 3,5 bilhões de anos, toda a vida na Terra foi unicelular, e não há um ambiente a que bactérias não se adaptem. Um dos pilares do estudo da vida alienígena são justamente esses bichinhos sem frescura – que, de semelhantes a nós, não têm muito mais que o DNA. Eles mostram o caminho para sobreviver em praticamente qualquer situação.
O que leva à questão: como encontrá-las?
Bem: coletar material de análise in loco ainda é uma meta utópica. Não há uma tecnologia de propulsão que dê conta sequer de alcançar Proxima Centauri – a estrela mais próxima do Sol, que abriga um planeta com potencial para ter água líquida. Também não há nada que nos permita observar diretamente um exoplaneta: eles não emitem luz própria, e a quantidade de luz refletida não é suficiente para alcançar nossos olhos.
Na verdade, telescópios caçadores de exoplanetas, cujo exemplo mais famoso é o já aposentado Kepler, usam truques bem mais sutis para detectar exoplanetas. Da sombra que o planeta faz quando passa na frente de sua estrela, é possível deduzir seu tamanho. Da maneira como a estrela oscila, sai a massa – pois estrelas “dançam” um pouquinho em resposta à gravidade de seus planetas.
Tendo em mãos tamanho e massa, calcula-se a densidade – que diz, por exemplo, se o planeta é sólido ou gasoso. Por último, caso o planeta tenha atmosfera (como o nosso), a luz da estrela que atravessa a atmosfera antes de nos alcançar carrega consigo informações sobre o coquetel de gases que a compõem.
Carrega porque cada molécula filtra a luz de uma maneira diferente, absorvendo certas cores (que equivalem a comprimentos de onda de radiação eletromagnética) e deixando outras cores passarem e alcançarem o telescópio. O nome dessa técnica é espectroscopia, e é graças a ela que sabemos a composição química de tudo no Universo – inclusive o Sol.
Esse coquetel, por si só, é uma pista. Por exemplo: a Terra, no início, praticamente não tinha oxigênio na atmosfera. O gás só passou a predominar graças à invenção da fotossíntese (feita inicialmente por cianobactérias; hoje, também pelas plantas). Atmosferas com anomalias desse tipo podem ser indício de ambientes fora de equilíbrio, alterados por seres vivos.
“Oxigênio e metano juntos na atmosfera de um planeta são bons indicadores de um processo biológico”, diz Abel Méndez, diretor do Laboratório de Habitabilidade Planetária da Universidade de Porto Rico, em Arecibo. “Qualquer um dos dois poderia ser produzido sozinho por um processo não biológico, mas se são produzidos juntos, um reage com o outro e ambos somem. Precisa haver um processo biológico fazendo a reposição constantemente.”
Fonte: Super