Altar encontrado na Guatemala revela conflito maia há 1,7 mil anos
Um reino pequeno, mas rico o suficiente para incomodar os vizinhos poderosos. Assim era Tikal, uma cidade maia de 2,4 mil anos de idade, no coração da atual Guatemala. Lá, uma equipe global de pesquisadores desenterrou um altar que revela segredos de uma época de turbulência política na região.
O altar foi construído por volta de 300 d.C. Ele é decorado com quatro painéis pintados de vermelho, preto e amarelo, representando uma pessoa usando um cocar de penas e rodeada por escudos ou trajes. O estilo da arte e da arquitetura é o que chama mais atenção: não é típico dos monumentos comumente encontrados na região, mas muito característico da cultura de Teotihuacan.
Teotihuacan era uma potência do mundo antigo, cuja sede ficava próxima da atual Cidade do México, a 1,3 mil quilômetros a noroeste de Tikal. O estilo é inconfundível. Há décadas, pesquisadores já sabem que as duas cidades tiveram conflitos importantes durante esse período, há 1,7 mil anos.
“Está cada vez mais claro que esse foi um período extraordinário de turbulência em Tikal”, disse Stephen Houston, coautor do artigo, em comunicado. “O que o altar confirma é que líderes ricos de Teotihuacan vieram a Tikal e criaram réplicas de instalações rituais que teriam existido em sua cidade natal. Isso mostra que Teotihuacan deixou uma forte marca lá.”
A teoria é de que o altar teria sido criado por um artesão altamente qualificado treinado em Teotihuacan que visitou a Tikal.
Fundada por volta de 850 a.C., Tikal existiu por gerações como uma pequena cidade que não chamava muita atenção, até se transformar em uma dinastia por volta de 100 d.C.
Os arqueólogos têm evidências de que Tikal e a muito mais poderosa Teotihuacan começaram a interagir regularmente cerca de dois séculos depois. O que, a princípio, parecia ser uma relação comercial casual rapidamente se tornou algo mais agressivo.
Em 1960, arqueólogos encontraram uma pedra cortada e mutilada com um texto bem preservado que descrevia o conflito em termos gerais.
Graças ao texto da pedra, eles descobriram que “por volta de 378 d.C., Teotihuacan estava essencialmente decapitando um reino”, disse Houston. “Eles removeram o rei e o substituíram por um quisling [cidadão de Tikal que colaborou com a ocupação estrangeira], um rei fantoche que se mostrou um instrumento local útil para Teotihuacan.”
Décadas mais tarde, os pesquisadores continuam encontrando pistas sobre esse período na região. Usando a tecnologia de detecção e alcance de luz (LiDAR), eles viram que, nos arredores de Tikal, havia uma réplica em escala reduzida da cidadela de Teotihuacan. Essa construção indica um período de presença de Teotihuacan com alguma forma de vigilância ou controle sob Tikal.
A princípio, as construções pareciam estar enterradas sob colinas naturais. O que os cientistas descobriram, entretanto, é que a obra foi enterrada intencionalmente, e a área foi abandonada.
“Os maias geralmente enterravam edifícios e os reconstruíam em cima”, disse o coautor Andrew Scherer. “Mas aqui, eles enterraram o altar e os prédios ao redor e simplesmente os abandonaram, mesmo que esse fosse um imóvel de primeira linha séculos depois. Eles o trataram quase como um memorial ou uma zona radioativa. Isso provavelmente mostra os sentimentos complicados que eles tinham em relação a Teotihuacan.”
A pintura do altar encontrado não é a única evidência da presença agressiva dos estrangeiros. Dentro do altar há duas pessoas sepultadas: uma criança sentada, uma posição rara em Tikal mas comum em Teotihuacan; e um homem enterrado com uma ponta de dardo feita de pedra obsidiana verde. Segundo os especialistas, o material e o design são distintos de Teotihuacan.
Os autores apontam como essa polêmica soa familiar: um império poderoso tenta destruir e saquear as riquezas de um pequeno paraíso.
“Todo mundo sabe o que aconteceu com a civilização asteca depois que os espanhóis chegaram”, disse Houston. “Nossas descobertas mostram evidências de que essa é uma história tão antiga quanto o tempo. Essas potências do México central entraram no mundo maia porque o viam como um lugar de riqueza extraordinária, de penas especiais de pássaros tropicais, jade e chocolate.”
Fonte: Super